Chama-se educação o processo mediante o qual se afeta uma pessoa estimulando-a a desenvolver suas capacidades cognitivas e físicas para se integrar plenamente à sociedade que a rodeia.

A educação possibilita o crescimento individual, a produção e reprodução social e cultural e permite o aperfeiçoamento das pessoas.

Ao nos referirmos à Educação Especial, relacionando-a ao setor educacional, contamos com pouco tempo de experiência, já que esta modalidade de educação foi realmente sistematizada na década de 60. De lá até os momentos atuais, muitas formas de pensar, pesquisar e agir foram perpassadas, mas não seria incoerente alertar para a existência, ainda hoje, de profissionais que continuam entendendo as escolas especiais com uma visão decadente que envolve somente o ato de “cuidar”, em detrimento do ato de “ensinar”, de um saber sistematizado, como acontecem nas escolas do ensino comum.

Na APAE BH, especificamente na Escola Oficina Sofia Antipoff, a Educação Especial engloba uma imensa diversidade de necessidades educativas especiais, assim como uma equipe multidimensional composta pelos mais diversos profissionais e especialistas. Seu objetivo principal é promover uma melhor qualidade de vida àqueles que, por algum motivo, necessitam de um atendimento mais adequado à sua realidade física, mental, sensorial e social.

Educamos nossos alunos para que possam viver em sociedade – conhecendo suas regras e identificando-se ou não com elas – mas respeitando-as como qualquer pessoa comum. Se nosso objetivo é a autonomia dos alunos, temos que ajudá-los a ser capazes de se autogovernarem.

De acordo com Piaget (1992), o desenvolvimento intelectual possui dois componentes: o cognitivo e o afetivo. Ambos se dão paralelamente e o cuidado com o aspecto afetivo é de fundamental importância. Todas as pessoas têm potencialidades. Os deficientes intelectuais também. Conclui-se, portanto, que mesmo com suas diferenças nas áreas biológicas, culturais, físicas, cognitivas e psíquicas, quando essas pessoas apresentam boa autoestima, têm motivação para aprender. O envolvimento emocional e o interesse pelo desenvolvimento dos nossos alunos podem levar o educador a perceber nas atividades diárias, evolução e mudanças de comportamentos significativos. Ao desenvolver uma relação de afeto com seus alunos, o professor cria uma nova dimensão na sala de aula. O desenvolvimento da autonomia cognitiva e afetiva, bem como a auto regulação saudável dependem do estabelecimento da cooperação com os colegas e demais professores, incluindo reciprocidade de sentimento e relações de respeito mútuo.

Para Freire (2013), “a educação é um ato de amor e, por isso, um ato de coragem. Não pode temer o debate. A análise da realidade. Não pode fugir à discussão criadora, sob pena de ser uma farsa”. (2013, p. 127) Nesse sentido, assumir a docência como um ato de amor é praticar o respeito às diferenças individuais na perspectiva inclusiva, não se negando a perceber e compreender a realidade tal qual ela se apresenta, ainda preconceituosa e excludente, mas com grandes possibilidades construtivas e transformadoras.

Segundo a Secretaria de Educação Especial, do Ministério da Educação, “Há que se levar em conta as escolhas do professor para ensinar e as do aluno para aprender. Essas escolhas não são espontâneas, aleatórias, mas demandam decisão, seleção de um caminho de aprendizagem, de uma metodologia de ensino, do uso de recursos didáticos pedagógicos. Da parte do aluno, essa escolha é mais limitada, pois o professor, por mais que seja aberto e acessível ao modo de aprender do aluno, não está ensinando individualmente, mas desenvolvendo um trabalho pedagógico coletivamente organizado, que tem limites para essas diferenças.” (MEC, SEED, 2007, p.7).

As pessoas com deficiência intelectual têm os mesmos direitos que qualquer outro cidadão e estes lhes são assegurados pela Constituição Federal. Assim, elas têm direito à vida, liberdade, igualdade, não discriminação, segurança, educação, saúde, moradia, lazer, previdência social, assistência social, entre outras coisas.

Na APAE-BH, buscamos alternativas educacionais na Educação Especial, nas quais o currículo seja o agente modificador do processo educacional, visando estar o mais próximo possível da realidade do aluno e selecionamos tudo aquilo que é possível ensinar em um determinado espaço educativo.

O currículo adaptado é um dos pontos considerados fortes na Educação Especial. As adaptações curriculares são os ajustes e modificações que precisam e devem ser feitos em suas diferentes instâncias para responder às necessidades de cada aluno, favorecendo as condições necessárias para a máxima efetivação da aprendizagem. Mas nenhum currículo adaptativo terá sentido se o Plano Individual do Aluno não for desenvolvido.

O gestor deve fazer um Plano de Desenvolvimento Individual (PDI) de cada aluno, no qual constarão os dados do aluno, informações médicas e terapêuticas, bem como os relatos dos pais sobre o que este aluno consegue fazer, e o que ele ainda precisa aprender. Com base nestas informações, os professores poderão fazer sua parte no plano individual do aluno, onde discorrerão sobre quais são as suas expectativas em relação ao aluno durante o ano letivo e quais materiais e estratégias serão usadas para alcançá-las.

A função do PDI é registrar os dados da avaliação do aluno e o plano de intervenção pedagógico especializado que será desenvolvido pelo professor. É constituído de duas partes: a primeira é destinada a informes e avaliação, e a segunda está voltada para a proposta de intervenção. Ou seja, o PDI é fundamental para a aplicação de um ensino de qualidade, e a ação do professor se torna assertiva passando, portanto, para uma educação especial de qualidade e garantia para uma melhor qualidade de vida.

Há uma preocupação maior com o ensino de qualidade do que com a educação de qualidade. Ensino e educação são conceitos diferentes. No ensino organiza-se uma série de atividades didáticas para ajudar os alunos a compreender áreas específicas do conhecimento (ciências, história, matemática). Na educação o foco, além de ensinar, é ajudar a integrar ensino e vida, conhecimento e ética, reflexão e ação, a ter uma visão de totalidade. Educar é ajudar a integrar todas as dimensões da vida, a encontrar nosso caminho intelectual, emocional, profissional, que nos realize e que contribua para modificar a sociedade que temos.

Ressalta Mizukami: “O objetivo da educação, portanto, não consistirá na transmissão de verdades, informações, demonstrações, modelos etc., e sim em que o aluno aprenda por si próprio, a conquistar essas verdades, mesmo que tenha de realizar todos os tateios pressupostos por qualquer atividade real. Autonomia intelectual será assegurada pelo desenvolvimento da personalidade e pela aquisição de instrumental lógico-racional. A educação deverá visar que cada aluno chegue a essa autonomia (MIZUKAMI, 1986, p.71).”

Em relação às práticas pedagógicas adotadas em sala de aula, as limitações do aluno com deficiência intelectual, sejam elas de ordem conceitual, prática ou social, devem ser levadas em consideração. Mas não do ponto de vista da incapacidade e sim da funcionalidade. O professor deve buscar as potencialidades do sujeito, adotando práticas que melhor possam desenvolvê-las.

O desafio é grande, afinal, não existem respostas nem formas prontas, mas é preciso ousar, nos adiantar e, às vezes, também retroceder para analisar o que já foi feito. A proposta inicial é de ensinar e/ou aprimorar em nossos alunos a comunicação, leitura e escrita (alfabetização),  mas nada nos impedirá de trabalharmos com outras áreas de conhecimento.

Uma das atitudes mais importantes desenvolvidas e praticadas diariamente pela Escola Oficina Sofia Antipoff junto aos seus alunos é a motivação. Não somente com elogios ao desempenho, mas fazer com que o processo de aprendizagem seja motivador em si mesmo. Os alunos devem ser levados a colocar toda a sua energia para enfrentar o desafio intelectual que a escola lhes apresenta. O prazer vem, assim, da própria aprendizagem, do sentimento de competência pessoal, da segurança de ser hábil para resolver problemas.

O educador tem sempre desafios a superar no tocante ao aluno especial e transpor estes desafios só será possível se houver um envolvimento real, uma transferência movida pela afetividade. Grande número de iniciativas individuais de professores em todo o mundo alcança êxito com crianças e jovens deficientes. O famoso caso Ellen Keller e Anne Sulivan é uma prova de que a busca de alternativas pode transformar situações aparentemente imutáveis. Que a afetividade influencia o processo ensino-aprendizagem e que vai além dos conteúdos didáticos, estudos na área do desenvolvimento humano já comprovam.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Lucianna Gontijo
Diretora da Escola Oficina Sofia Antipoff da APAE-BH