Freire introduz Pedagogia da Autonomia explicando suas razões para analisar a prática pedagógica do professor em relação à autonomia de ser e de saber do educando. Ele enfatiza a necessidade de se respeitar o conhecimento que o aluno traz consigo para a escola, visto ser ele um sujeito social e histórico e de se compreender que “formar é muito mais do que puramente treinar o educando no desempenho de destrezas”. Freire define essa postura como ética e defende a ideia de que o educador deve buscar essa ética, que ele chama de “ética universal do ser humano”, essencial para o trabalho docente.

Como eixo norteador de sua prática pedagógica, Freire defende que “formar” é muito mais que ensinar o desempenho de destrezas, atentando para a necessidade da formação ética dos educadores, conscientizando-os sobre a importância de estimular os educandos a uma reflexão crítica da realidade em que está inserido.

O autor afirma que o professor deverá, também, conduzir a maneira de pensar, pois a prática em si é um testemunho rigoroso de decência e pureza e defende a “disponibilidade ao risco, a aceitação do novo e a utilização de um critério para a recusa do velho”, estando presente a rejeição a qualquer tipo de discriminação. Ele ainda destaca a importância de propiciar condições aos educandos em suas socializações com os outros e com o professor, de testar a experiência de assumir-se como um ser histórico e social que pensa, que critica, que opina, que tem sonhos, que se comunica e que dá sugestões. Freire acredita que a educação é uma forma de transformação da realidade que não é neutra e nem indiferente, mas que tanto pode destruir a ideologia dominante, como mantê-la, e ressalta o quanto um determinado gesto do educador pode repercutir na vida de um aluno (afetividade e postura) e que a reflexão sobre o assunto é necessária, pois, segundo ele, ensinar exige respeito aos saberes do educando. A construção de um conhecimento em parceria com o educando depende da relevância que o educador dá ao contexto social.

A autonomia é uma construção cultural, não é algo natural, depende da relação do homem com os outros e destes com o conhecimento. Então, neste processo, o ato de ensinar, defende Freire, é fundamental. E para ele, “(…) ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou sua construção” (FREIRE, 1998, p. 25). Ensinar pressupõe relação dialógica, na qual docente e discente interagem dialeticamente com perguntas e busca de respostas para a problematização em curso. É um processo de interlocução, no qual indagações se sucedem à procura de inteligibilidade dos fenômenos sociais, culturais ou políticos, e propõe a análise crítica, observando as diversas dimensões da conexão dos fenômenos, através do lançamento de hipóteses e definição de formas de entendimento.

Ao buscar formas de ensinar melhor e de repassar seu conteúdo, o educador pode utilizar de métodos que possibilitem ao discente uma melhor compreensão no que diz respeito ao aprendizado. Ensinar vai além de conteúdos ou de métodos rigorosos, permitindo que o educando utilize o seu cotidiano, não se prendendo somente ao livro didático. É exatamente neste sentido que ensinar não se esgota no tratamento de objeto ou de conteúdo.

Para ensinar é necessário que o educador observe a realidade na qual está inserido, incluindo seus conteúdos programáticos, a fim de se adaptar ao dia a dia. O professor deve ter consciência de que poderá dar a aula que programou, se conseguir adequá-la à vida de seus alunos

A Pedagogia da Autonomia é uma verdadeira lição, não de como um professor deve agir diante de seus alunos, nas um roteiro perfeito que foi escrito para aqueles que, de coração aberto e, claro, grande vocação, se empenham em transformar a educação vigente. É, de fato, um roteiro que, de forma muito simples, ensina o professor a ensinar, pois ensinar não deve ser apenas transferência de conteúdos, mas um ato de respeito ao próximo, à sua bagagem e particularidades.

Lucianna Gontijo – Diretora Educacional da Escola APAE-BH

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

GADOTTI, Moacir. Convite à leitura de Paulo Freire. São Paulo: Ed. Scipione, 1989.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. São Paulo: Editora Paz e Terra, 1997.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Editora Paz e Terra, 1994

MACHADO, Rita de Cássia de Fraga. Autonomia. In:. STRECK, Danilo R.; REDIN, Euclides; ZITKOSKI, Jaime José (org.). Dicionário Paulo Freire. Belo Horizonte: Autêntica, 2008.

VASCONCELOS, Maria Lucia Marcondes Carvalho & BRITO, Regina Helena Pires de. Conceitos de educação em Paulo Freire. Petrópolis, RJ: Vozes, 2006. [vc_images_carousel images=”15363,15364″ img_size=”medium”]