Como valorizar os alunos com necessidades educativas especiais, por suas habilidades e não por suas limitações?
Na busca pela resposta desse problema, pode-se argumentar que o jovem com deficiência intelectual, como qualquer outro, deve ser visto como um ser ativo, capaz de cuidar de suas necessidades pessoais e colaborar com as atividades da casa e da comunidade.
O conceito de competência, de acordo com Perrenoud (1999), surgiu para atender uma demanda do campo profissional e, depois, migrou para o campo educacional. Conforme Zabala e Arnau (2010), essa disseminação ocorreu de forma acelerada e causou opiniões a favor e contra no que diz respeito ao uso de habilidades e competências nas instituições escolares, pois passou a ser utilizada nesse âmbito com o intuito de sobrepujar o ensino baseado apenas na memorização.
Situações-problema são desafios que surgem durante a caminhada do aluno. Segundo Macedo (2005a), os problemas estão acima dos exercícios, pois exercícios podem ser apenas repetições e situações-problema envolvem o planejamento, a tomada de decisão, a análise do contexto, além do desenvolvimento de habilidades e competências. Para o autor, problema “é aquilo que se enfrenta e cuja solução, já conhecida ou incorporada, não é suficiente, ao menos como conteúdo.” (MACEDO, 2005a, p. 15). Portanto, situações-problema necessitam ser criadas, inovadas e devem ter relação com o cotidiano do educando para que, assim, possam ser desenvolvidas novas habilidades e competências.
Segundo a Enciclopédia de Pedagogia Universitária, competência refere-se ao “[…] sentido de saber fazer bem o dever. Na verdade, ela se refere sempre a um fazer que requer um conjunto de saberes e implica um posicionamento diante daquilo que se apresenta como desejável e necessário […]” (2006, p. 426).
Competências não são objetivos, não são indicadores de desempenho e tampouco potencialidades da mente humana, pois estas só se tornam competências através do desenvolvimento da aprendizagem, ou seja, as competências são construídas e adquiridas.
Para se falar em competências é necessário conceituar, também, habilidades. Segundo o dicionário Aurélio, habilidade é “qualidade daquele que é hábil; capacidade, destreza, agilidade: ter habilidade para trabalhos manuais (…)” (FERREIRA, 2010). Essa conceituação vai ao encontro do que Perrenoud (1999) escreve, pois para ele quando o sujeito passa a movimentar conhecimentos e capacidades para resolver uma situação-problema da vida real sem ao menos pensar ou planejar, então, ele está utilizando a habilidade.
A habilidade é constituída por uma série de procedimentos mentais que o indivíduo aciona para resolver uma situação real, na qual ele precise tomar uma decisão. Por exemplo, quando um aluno está aprendendo a multiplicar, ele utiliza a habilidade da adição e da conservação do número que ele já possui para resolver o novo problema.
Conhecer o aluno significa perceber se ele já sabe, já aprendeu, o quê aprendeu, qual competência já atingiu, qual ainda está sendo construída e qual precisa ser trabalhada. É preciso estabelecer outras relações com o aluno, ir além do exercício e da repetição; mas tomar decisões, analisar o contexto e separar e articular as partes do problema em busca de soluções.
A capacidade é aquilo que é possível fazer. Mas, se uma capacidade não é trabalhada ou incentivada, ela se perde. Temos capacidades motoras, cognitivas e emocionais.
A habilidade é aquela capacidade que podemos colocar em prática.
Competência é a capacidade de mobilizar os recursos mentais para executar uma tarefa na busca da solução de um problema.
Todos os objetivos do ensino são importantes, desde que os conceitos ou as habilidades ensinadas sejam funcionais e possam ser utilizadas ao longo da vida dos alunos.
Ensinar cores é importante, mas tornar esse conhecimento funcional para o aluno é ainda mais importante. Utilizam-se cores no cotidiano quando se selecionam produtos em supermercados ou lojas, para identificar sinais de trânsito, distinguir as roupas preferidas das demais, distinguir os alimentos e discriminar objetos em que esse conhecimento é necessário.
Desta maneira, discriminar cores passa a ser imediatamente funcional e amplamente aplicável em situações semelhantes. O mesmo ocorre com as habilidades de recortar, colar, pintar, desenhar, escrever, apontar, etc. que podem ser mais motivadoras e interessantes quando há necessidade dessas habilidades em oportunidades reais que o cotidiano oferece. Outro exemplo: não ficamos recortando papéis ou outros objetos ao acaso. A habilidade de recortar é útil quando embrulhamos um presente, realizamos trabalhos artesanais com tecidos ou papéis, abrimos correspondência etc. Nesse sentido, quando os objetivos de ensino são úteis e fazem parte do dia-a-dia, a maioria dos alunos recorda e retém a informação ou buscam o aperfeiçoamento no desempenho das atividades. Do contrário, passa-se muito tempo fazendo algo desinteressante e que não leva o aluno a um conhecimento que ele possa utilizar imediatamente. Como resultado, o educando enfrenta fracassos contínuos que frustram e desmotivam.
Na hipótese de fracasso ou não engajamento do aluno nas atividades, deve-se promover a adequação dos objetivos e das estratégias de ensino às características individuais e analisar, também, o desempenho do aluno nas atividades. Os dados dessas observações auxiliam o professor na revisão das condições de ensino, a definir as mudanças nas estratégias e a reavaliar o ensino durante o decorrer do tempo. Isso significa avaliar procedimentos e técnicas de ensino, seus efeitos e modificar o que for necessário para promover a aprendizagem. Assim, o papel do professor é ser o agente facilitador no processo de ensino/aprendizagem.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
- CORREIA, L. M.; TONINI, A. Avaliar para intervir: um modelo educacional para alunos com necessidades especiais. Revista Educação Especial, Marília, v.25, n.44, p. 367-382, 2012.
- CURTO, L. M.; MORILLO, M. M.; FEIXIDÓ, M. M. Escrever e ler: como as crianças aprendem e como o professor pode ensiná-las a escrever e ler. Tradução: Ernani Rosa. Porto Alegre: Artmed, 2000.
- GONZÁLEZ, J. A. T. Educação e diversidade: bases didáticas e Organizativas. Tradução de Ernani Rosa. Porto Alegre: Artmed, 2002.
- Avaliação pedagógica do aluno com deficiência e a prática do professor de educação especial. In: ENCONTRO DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO DA REGIÃO SUDESTE, 10., 2011b, Rio de Janeiro. Anais… Rio de Janeiro: Anpedinha, 2011b. p.1-6.
- MACEDO, R. S. Currículo: campo, conceito e pesquisa. Petrópolis, RJ: Vozes, 2007. MIURA, R. K. K. Considerações sobre o Currículo Funcional Natural – CFN. In: OLIVEIRA, A. A. S.; OMOTE, S.; GIROTO, C. R. M. (Org.). Inclusão Escolar: as contribuições da educação especial. São Paulo: Cultura Acadêmica, Marília: Fundepe, 2008. p. 153-165.
- SACRISTAN, G. O Currículo, uma reflexão sobre a prática. Trad. Ernani F. da F. Rosa. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2000.
Lucianna Gontijo
Diretora Pedagógica da Escola Oficina Sofia Antipoff